Existem alguns projetos em que a simples ideia gera um estranhamento. Muitas vezes um pitching errado faz com que uma boa ideia caia num abismo e nunca veja a luz dos cinemas. Há também aquelas que não deveriam sair do papel. Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes é um desses projetos. O longa-metragem é uma jornada enfadonha, cansativa e sem propósito dos delírios de um cantor que sonha em ser ator. O filme, estrelado por The Weeknd (The Idol, de 2023), é uma das estreias desta quinta-feira (15) e chega aos cinemas sem trazer um centavo de interesse ao público.
A proposta da produção é clara: The Weeknd resolveu financiar um filme para divulgar seu novo álbum e, de quebra, ainda faz uma digressão terapêutica sobre seus temores e dores. Isso soa arrogante e chato, não é? Então, este é Hurry Up Tomorrow. Em vez de focar seus esforços artísticos em sua carreira musical – que ele mesmo ironiza no roteiro em determinado ponto -, o cantor nos leva aos cinemas nesta viagem pessoal surrealista que não conduz o espectador para nenhum lugar – a não ser ao raso de suas angústias mais egocentradas.
Todo esse festival dramático é conduzido por um tom de suspense desmedido e que nunca se fecha em si. E é decepcionante pensar que a pessoa que dirige essa atrocidade é a mesma que soube escrever e dirigir Ao Cair da Noite (2017). O cineasta Trey Edward Shults não é capaz de emplacar sua visão no que parece ser um extenso clipe musical desinteressante. Shults não dá identidade e nem consegue entregar um filme sequer bem conduzido. Existe uma sensação constante de que Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes está completamente picotado, como se ele tivesse sido o resultado de uma chacina de ideias desconjuntadas.
Para completar esse cenário problemático na base criativa do projeto, o roteiro foi feito por três pessoas, sendo uma delas Abel Tesfaye – nome artístico de The Weeknd quando atua. Além do cantor que claramente deveria ficar apenas escrevendo suas músicas, o texto também é assinado por Shults e Reza Fahim, criador da série The Idol. Diante desse cenário, Hurry Up Tomorrow parece nunca ter tido uma chance de ser bem sucedido como uma narrativa cinematográfica de qualidade. A falta de liberdade criativa do cineasta unida a presença e interferência de Abel tornaram o projeto uma bomba-relógio que já explodiu quando o filme começou a ser gravado.

A confusão do roteiro e a dedicação do mesmo para falar das lamúrias dessa pseudo ‘versão alternativa’ do The Weeknd entregam uma história sem propósito algum. O espectador passa o filme inteiro esperando que algo de relevante ou interessante aconteça e é frustrado a cada segundo. Nada leva a lugar nenhum, a não a um divã terapêutico que poderia ter evitado a produção de Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes. A narrativa é mal desenvolvida, rasa e, por vezes, vergonhosa. É um longa para ser completamente esquecido, se o público for capaz de superar o trauma que é assisti-lo.
Diante desse texto assombroso, o elenco não tinha muito o que fazer. Ainda que carregue nomes como Jenna Ortega (Pânico VI, de 2023, e Os Fantasmas Ainda Se Divertem, de 2024) e Barry Keoghan (Os Banshees de Inisherin, de 2022, e Saltburn, de 2023) em seu elenco, Hurry Up Tomorrow não deixa nem seu elenco passar ileso. O roteiro é tão descuidado e cheio de fragilidades que tornam Keoghan completamente esquecível. O ator tem uma participação estereotipada e estranha – e não no bom sentido para o padrão dele. Jenna, por mais que se esforce e também tenha talento, não tem de onde tirar profundidade de uma personagem mal desenvolvida e sem camadas. É decepcionante ver dois talentos desperdiçados como eles são nesse filme.
O maior problema, no entanto, é The Weeknd e seu delírio de ser ator. A verdade é que Abel é uma piada como ator. Aparentemente sua participação sofrível na série The Idol, não foi o suficiente, mas é vital que entendam que ele não sabe atuar. Ele não consegue convencer o público nem mesmo fazendo uma versão de si mesmo. Suas cenas são ainda mais superficiais que seus colegas de cena justamente por ele não conseguir entregar mais do que o terrível óbvio. Doa a quem doer, mas se colocar ele e Jade Picon a 80km/h, não sei quem é mais sem sal, carisma ou capacidade cênica. Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes é uma pá de cal em sua frágil carreira como ator.
Para completar essa marcha fúnebre que a Lionsgate tenta chamar de filme, nem sequer a visualidade desse clipe-delírio é interessante. O filme tem uma proposta cansativa e repetitiva de filmes indies, com uma pitada de visual de videoclipes, sem a construção de sua proposta. O que fica é uma tentativa de mimetizar o que seriam esses longas visualmente interessantes e alternativos, sem nenhum tipo de arcabouço que defina e justifique as escolhas. A verdade é que Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes não cumpre sequer o seu título. É uma narrativa soberba, disfuncional e rasa, que nem sequer serve como um clipe, por ser longo demais. O que fica é uma sessão de terapia forçada ao público, que se estende excessivamente, mal sucedida e que absolutamente ninguém pediu.
Direção: Trey Edward Shults
Elenco: Abel Tesfaye, Jenna Ortega e Barry Keoghan
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