A Garota da Vez

Crítica: A Garota da Vez

3.5

A Garota da Vez é a promissora estreia da atriz Anna Kendrick como diretora. Para o seu debut, Kendrick leva para as telas a história real do serial killer Rodney Alcala. Ao longo da década de 1970, Alcala assassinou cerca de 130 mulheres, um número não muito preciso pois parte da atribuição da autoria dos crimes ficou comprometida pela morosidade com a qual o caso foi tratado.

De forma muito sensível e inteligente, o roteiro de Ian McDonald em A Garota da Vez tem uma perspectiva ausente séries e filmes, documentários ou ficções baseadas em eventos reais, true crimes. O longa dirigido por Anna Kendrick acerta ao desviar o foco dos assassinos e olhar um pouco mais para suas vítimas. A Garota da Vez soa desde o princípio como uma obra que tem interesse genuíno pelas mulheres assassinadas e violentadas por Alcala, dando um protagonismo a elas.

Em A Garota da Vez é o background das vítimas do assassino que conhecemos e são suas emoções e nuances que são destacadas pela cineasta. Em momento algum o filme procura um background mais robusto para criar um “mapa psicológico” que “justifique” as ações de Alcala. O serial killer é tratado como uma espécie de força maligna representativa de um sexismo próprio da época, um comportamento social muito bem retratado pelo filme, por sinal.

O roteiro tem como ponto de partida a história de Sheryl, uma das poucas sobreviventes de Alcala. Nos anos 1970, Sheryl tentava arduamente um lugar ao sol em Hollywood. O pouco que a atriz consegue é uma participação em um game show de namoro onde ela teria que escolher entre três pretendentes qual deles seria sua companhia em uma viagem patrocinada pela emissora – tudo falso, é claro. A participação de Sheryl no programa até foi divertida, mas revelou-se um grande trauma para a atriz, o suficiente para fazê-la desistir da carreira que vinha almejando até então. Entre os pretendentes de Sheryl na atração televisionada estava Rodney Alcala. O serial killer saiu vencedor do game e investiu contra a jovem protagonista daquele episódio logo depois da transmissão do programa. A tentativa de assassinato foi uma das únicas que não deu certo.

A Garota da Vez

O longa também é uma oportunidade para Kendrick e seu roteirista abordarem de forma muito sensível e inteligente a cultura sexista da época e como ela permeava a indústria do entretenimento nos bastidores. A todo momento, a protagonista de A Garota da Vez e as demais personagens femininas do longa são interpeladas por piadinhas e gestos inconvenientes que incomodam. As jovens mulheres do filme não encontram muito espaço para a expressão desse desagrado, afinal as abordagens masculinas as pegam de surpresa ou mesmo estava introjetada na sociedade da época tolerar condutas extremamente invasivas e sexistas.

Em parte dos momentos de assédio, como estratégia de defesa, por exemplo, Sheryl passa por cima do desconforto, afinal, muita coisa estava em jogo (sua oportunidade de ascensão na carreira da atriz) ou como mulher da época compreendia inconscientemente que seu papel era tolerar determinadas abordagens masculinas. A libertação para a personagem surge quando ela encontra no game show uma forma de manifestar esse incomodo. Participando do programa de TV, Sheryl trata com muita ironia as respostas machistas dos seus candidatos a date, por exemplo. Por essa sutileza com que trata uma temática tão delicada, de forma tão precisa e acurada no âmago da questão é que A Garota da Vez conquista sua plateia mais atenta. A atuação de Kendrick é ponto chave nesse intento pois parte do desempenho da atriz é focado em suas sutis reações às abordagens e ela faz isso de forma impecável.

Em A Garota da Vez, Anna Kendrick, mais uma vez, entrega uma excelente atuação dosando muito bem sua presença carismática com a profundidade com a qual revela os detalhes da psicologia dessa protagonista em gestos sutis que nunca chamam a atenção para si, mas que estão atentos à personalidade da personagem em questão. A artista também demonstra muita segurança na direção, conduzindo com propriedade o suspense de sua história. O resultado é um trabalho extremamente maduro que nem dá indícios de ser fruto dos esforços de uma estreante.

Direção: Anna Kendrick

Elenco: Anna Kendrick, Tony Hale, Jedidiah Goodacre

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