Após dez anos de Porta a Porta – a Política em Dois Tempos, Marcelo Brennand retorna ao universo da política feita em cidades pequenas do Brasil. Aqui em Curral, novamente, ele retrata Gravatá, município interiorano de Pernambuco, em período de votação para prefeito e vereador. Durante o filme, há uma construção progressiva das tensões dentro das relações das personagens do enredo. As suas camadas vão sendo descortinadas à medida que a trama avança. Alguns acontecimentos acabam sendo óbvios, mas o que vale aqui é justamente o desenvolvimento desta história e como a direção e a montagem dialogam com ela.
Nas sequências nas quais as ações são mais marcadas, os cortes secos contribuem para o estabelecimento de tensão. Não que este recurso seja criativo, claro, mas ele ajuda a colocar o espectador na atmosfera desejada, amplificando a sua apreensão. Ao mesmo tempo, esta aceleração trazida pela edição não é gratuita, tendo antes sido construída por momentos de câmera mais parada e planos mais longos, onde se destrincham fatos sobre a cidade, as eleições e os habitantes de Gravatá. Estas descobertas também estão presentes nos detalhes dos diálogos, como no momento em que Chico (Thomas Aquino) e Joel (Rodrigo García) falam sobre a campanha e diversos comentários racistas, misóginos, lesbo e bifóbicos vêm de Joel. O silêncio e o choque de Chico são fomentados pelos closes e pelo seu silêncio, mostrando uma constatação dele, diante do antigo amigo de infância, agora candidato. Há também um engasgo e uma vontade de rebater que vai ficando guardada.
Apesar desta estratégia funcionar na maior parte da projeção, entre o final do segundo ato e o encerramento do longa-metragem, há uma queda rítmica, no qual a tônica permanece constante, deixando uma dilatação desnecessária para a chegada do desfecho da obra. Este fator diminui um pouco do impacto que a última cena parece desejar passar. Curral cria uma espécie de linha crescente e quando chega em seu ápice, se segura por muito tempo na linha reta, quebrando a expectativa de quem o assiste. Depois, o resultado que traz é um tanto tardio. Este fator não compromete a totalidade da produção, mas reduz a sua qualidade.
Outra questão que chama atenção é a falta de personalidade e construção mais elaborada das personagens. O elenco não chega a ser ruim, longe disso. Há um trabalho em procurar imprimir verdade e uma tentativa de criação de jogo cênico. No entanto, são tantos arquétipos colocados na tela que eles não vão muito além disso. Poderia sim funcionar esta escolha de representação, mas, aqui, fica superficial, não alcançando as sensações e emoções necessárias que precisam ser passadas. Até Aquino, que possui uma série de trabalhos fortes, parece um tanto engessado, repetindo sua chave, sem trazer algo diferente para seu Chico Caixa.
Ainda assim, no geral, Curral vale a pena por apresentar certo apuro estético, onde técnica e discurso estão casados. Há também um importante debate que ele evoca sobre a sordidez das campanhas políticas e como existem aqueles que se aproveitam de um contexto repleto de pessoas com necessidades básicas para buscar os manipular e controlar com pequenos favores e quantias. Isto já é algo bastante sabido, porém tão antigo e repetido que é sempre importante uma retomada nesta discussão.
Direção: Marcelo Brennand
Elenco: Thomas Aquino, José Dumont, Carla Salle, Rodrigo Garcia
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