Crítica: Sully – O Herói do Rio Hudson

Em Sully: O Herói do Rio Hudson, Clint Eastwood (Menina de Ouro) nos narra o episódio verídico envolvendo o capitão Chesley “Sully” Sullenberger que, em janeiro de 2009, após sair do aeroporto de La Guardia em Nova York e ter as turbinas do avião que pilotava danificadas por uma revoada de pássaros, faz um pouso forçado no rio Hudson e salva os 150 passageiros a bordo da aeronave. Instantaneamente, como manda o circo midiático, Sully se transforma em um herói nacional, trazendo para si todos os louros, mas também todo o peso que o título impõe.

Como bom exemplar da filmografia do seu realizador, Sully conta com o olhar elegante de Clint Eastwood para os fatos narrados e para o próprio orgulho americano que inescapavelmente transpira por todos os seus poros, caso contrário não seria um filme de Eastwood. O diretor sempre confere um tom patriótico a suas histórias e a jornada dos seus protagonistas, flertando sem grandes receios com a emoção em alta intensidade, mas, como ocorre nos seus melhores longas, evita as afetações dos seus colegas. Assim, Eastwood consegue transformar Sully numa história eminentemente americana, mas sem a histeria, as frases de efeito e a agressividade nacionalista de alguns realizadores que trafegam por uma mesma chave de discurso que a sua.

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Em Sully fica evidente que Eastwood retoma um tema que lhe foi muito caro em Sniper Americano, seu filme anterior, as consequências de atos que aos olhos públicos são considerados como heróicos. Assim como o Chris Kyle, só que em um outro contexto, Sully vive o fardo da fama que lhe atribuem e muitas vezes entra em conflito a respeito da própria natureza do seu feito. O início de Sully nos apresenta seu protagonista em meio a tais questionamentos e todos eles são retomados na excelente sequência em que o personagem é julgado pela agência de regulação aérea norte-americana ao lado do seu co-piloto Jeff Skiles, interpretado por Aaron Eckhart (de Batman: O Cavaleiro das Trevas). Esse olhar de Eastwood para o seu protagonista beneficia a interpretação de Tom Hanks (Ponte dos Espiões), que vive o Capitão Sully como um homem nobre e honrado, mas evita as afetações típicas das composições do herói americano ausente de imperfeições, ou seja, uma interpretação coerente com os propósitos do filme e do seu realizador.  É uma pena, contudo, que Eastwood desperdice uma atriz do calibre de Laura Linney (O Mestre dos Gênios) na pele da esposa do protagonista que só contracena com o mesmo através da linha do telefone, um tipo de clichê que já deveria ter sido extinto nesse tipo de história há anos.

O longa tem uma estrutura relativamente questionável. Sully intercala momentos em que seu protagonista assimila o seu feito com a própria reconstituição do acidente e do pouso forçado. Esta decisão do roteiro de Todd Komarnicki no lugar de acender um interesse do espectador pelos eventos, serve apenas para causar uma estranheza pelas suas idas e vindas na linha temporal e pela repetição insistente da sequência do avião. Por sorte, temos Eastwood na direção, contornando esses problemas e evitando reiterações de emoções desnecessárias ao espectador.

 De maneira muito discreta, elegante e emocionalmente sincera (e sem sensacionalismo), Eastwood ainda consegue inserir Sully em um momento da aviação norte-americana pós-11 de setembro, tornando o olhar do seu personagem para o seu próprio ato e sua forma de lidar com uma situação potencialmente traumática ainda mais urgente aos olhos do espectador. Sully pode não ser um dos grandes feitos da carreira de Eastwood, mas ao menos reitera com acertos as marcas do realizador.

Assista ao trailer do filme: