Crítica: O Jogo da Imitação

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À sua maneira, O Jogo da Imitação ocupa na temporada de prêmios hollywoodiana a cotação dos dramas de guerra britânicos. Todo o entorno e o conteúdo do filme do norueguês Morten Tyldum exala a tradição inglesa que a Academia adora reconhecer e que já deu certo em filmes como O Discurso do Rei, não por acaso, distribuído pelo Midas do Oscar, o produtor Harvey Weinstein através da sua The Weinstein Company. No entanto, essa tradição inglesa não convive de maneira pacífica no próprio filme. O Jogo da Imitação traz em si, do início ao fim, uma tensão entre a vontade de mostrar que é mais do que um novo O Discurso do Rei e obedecer uma cartilha que dá certo entre uma média de votantes do Oscar. O resultado é um filme instável que permanece preso às convenções, ainda que deseje ser mais do que se espera dele.
O Jogo da Imitação traz a história do matemático inglês Alan Turning (Benedict Cumberbatch), um gênio com dificuldades de socialização que passa a ser peça fundamental em uma operação de decodificação das mensagens do exército alemão durante a Segunda Guerra Mundial. Turning criou uma máquina batizada de Christopher que realizou a leitura das orientações cifradas de ataque dos alemães, revolucionando a ciência da computação e reduzindo o período de duração do conflito mundial. Contudo, todo esse pioneirismo e a importância de Turning no século passado foram sufocados pela sua relação com a sua própria homossexualidade e como isso passou a ser usado contra o próprio matemático durante e após o conflito.

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Trazer o trabalho de Turning à tona já confere um grande mérito a O Jogo da Imitação. Tornar o seu legado público e reconhecido, algo que a própria História não fez, torna o filme relevante de alguma forma, ou seja, é um longa que acaba tendo alguma função para a sociedade independente do resultado não ser plenamente satisfatório. Morten Tyldum conduz o seu filme em temperatura branda e até mesmo a conturbada relação de Turning com sua própria sexualidade, algo que é sugerido como uma força motriz do filme, é assumido com certa cautela.
Talvez seja esta a característica de O Jogo da Imitação: trata-se de um filme cauteloso. Tyldum não assume determinados riscos que se impõem a sua narrativa e, entre a trama de espionagem e os conflitos psicológicos do seu protagonista, fica em um meio termo que não compromete o resultado, mas também o torna esquecível até que se assista a um próximo filme ambientado no mesmo período e com o mesmo tom. O elenco é interessante, sobretudo Benedict Cumberbatch, que sabe conduzir muito bem a trajetória do seu conturbado personagem sem maiores afetações. Há também Keira Knightley, melhorando sensivelmente como atriz, ainda que sua personagem aqui soe forçada em sua função de manter o espectador ciente dos conflitos de Turning com sua sexualidade, algo desnecessário, mas trata-se de um elemento importante para a trama e que por vezes é o único impulsionador das emoções mais profundas do protagonista.

Benedict Cumberbatch as Turing with Keira Knightley as Joan Clarke in The Imitation Game.

Sem grandes picos de emoção ou frescor cinematográfico, O Jogo da Imitação é um filme com temas controversos em uma roupagem tradicional. Tão sufocado em seus propósitos quanto a sexualidade do seu protagonista, O Jogo da Imitação é um “jogador” conhecido da temporada de prêmios, um filme que está na seleção para agradar uma média de eleitores e que pode nem ser mais repercutido pelos próximos anos. No entanto, existe uma história omitida e um propósito humano de torná-la pública que supera qualquer critério de avaliação estritamente cinematográfico e o faz ocupar um lugar no mínimo especial.

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