Crítica: Malévola

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Angelina Jolie encarna perfeitamente no papel de Malévola

 

Acredito que quando se cria uma expectativa muito grande em cima de um filme, a chance dele dar errado ou decepcionar cresce proporcionalmente. Verdade ou mentira, o fato é que Malévola entrou exatamente nesta estatística e colocou muita gente para sair triste do cinema.

Em primeiro lugar é bom lembrar que esta é uma releitura da clássica história infantil eternizada pelos estúdios de desenho animado da Disney. Na animação, Malévola é uma feiticeira má que se revolta ao descobrir que não foi convidada para o batizado da princesa que nasceu e resolve se vingar da família real, jogando uma maldição na menina. Desesperados, rei e rainha pedem a ajuda de três fadas para esconder a criança pelos seus primeiros dezesseis anos, tentando desta forma preservar a bebê do feitiço. A vilã então passa anos procurando a herdeira do trono, na tentativa de concretizar a praga.

Acredito que seja problemático colocar uma antagonista como papel principal de uma trama. A função de uma vilã é ponderar a bondade da protagonista e tentar criar um outro lado da moeda. Uma vez que você coloca o personagem do mal no centro da trama, surge o problema. Mas infelizmente, esse é o menor dos problemas deste longa. Ele tinha a chance de ser muito bom se trabalhassem direito o lado vil da, então, protagonista. Ao contrário, eles resolvem humanizar Malévola e perdem completamente esta dosagem.

Malévola começa com uma boa descrição e contextualização de como a vilã se tornou má do jeito que pretende ser. E isso é extremamente animador. Faz com que o espectador acredite que muitas perguntas deixadas pelo desenho animado sejam respondidas. No entanto, o problema começa quando o longa leva muito tempo nessa explicação. O roteiro aprofunda demais, cria cenas desnecessariamente longas e demora além da conta para entrar na parte principal e conhecida de todos, que é a Bela Adormecida.

Elle Fanning também assume toda a suavidade de Aurora
Elle Fanning também assume toda a suavidade de Aurora

 

Claro que a decisão de explicar tudo acaba humanizando a vilã de uma forma interessante, mostrando que ela não nasceu simplesmente ruim e que acontecimentos da vida é que endureceram seu coração. Legal, se não fosse o fato de que o motivo disso tudo foi um homem que decepcionou Malévola. Toda a personalidade e feminismo sustentados pela vilã do desenho animado, que é autossuficiente, amedrontadora e manda e desmanda na corte, cai por terra deixando ela como, literalmente, uma mal amada.

Aí você pensa que o filme já está suficientemente decepcionante, quando a coisa vai piorando. É de se imaginar que um longa sobre uma vilã que assume o papel principal e que tem um trailer super sombrio com uma trilha sonora macabra, tenha a protagonista como alguém movido pelo ódio e pela vingança, distribuindo terror por onde passa. Chega a ser triste pensar que no alto dos seus quase 100 minutos, Malévola é efetivamente má por três minutos, no máximo. Para se ter uma ideia, ela faz amizade com Aurora. Percebe-se, por aí, o andamento da trama.

Então, chegamos a outro problema. Você tem um filme protagonizado por uma vilã que não age como vilã, trazendo uma narrativa morna e sem um ápice esperado. A todo momento o espectador espera que ela vire a casaca e mostre que estava fingindo. Para tristeza geral da nação, isso não acontece, bestificando ainda mais a personagem.

A história da Bela Adormecida se perde na bestificação da vilã
A história da Bela Adormecida se perde na bestificação da vilã

 

Claro que Malévola não é de todo ruim. O filme em si é bom. A qualidade dos efeitos especiais é muito boa, casando perfeitamente com os atores e dando fluidez, neste sentido, ao longa. A trilha sonora também é bem escolhida. Toda a direção de fotografia acertou bastante nos cenários e a escolha de trajes para Malévola, intercalando quando ela agia para o bem ou para o mal (embora efetivamente a diferença fosse mínima), foi uma decisão acertada do pessoal do figurino.

No quesito atores, ótima escolha de elenco. Elle Fanning encarna lindamente no papel de Aurora, trazendo toda a inocência da personagem, beleza nata e suavidade nos gestos. Destaque muito especial para Angelina Jolie, que se adequou perfeitamente no papel da “vilã”, pontuando todas as variações de sentimentos e personalidade. De verdade, ela está idêntica à personagem do desenho animado e a maquiagem usada foi extremamente acertada. O resto do elenco também atua bem e compõe o grupo.

É incrível, no entanto, a capacidade de esquecimento que o enredo tem. Em muitos momentos os personagens simplesmente somem sem explicação alguma e reaparecem como se nada tivesse acontecido, cenas depois. Quando Aurora se perde na floresta e faz amizade com ninguém menos que Malévola, as três fadas que tomam conta dela não dão por sua falta hora nenhuma. O mesmo acontece com o príncipe Felipe, coitado, que surge por dois segundos e é completamente esquecido o resto do longa.

Lamentavelmente, nada disso consegue se sobressair por conta de um roteiro muito mal formulado e de caráter duvidoso. A maneira como a vilã foi retratada vai de encontro com toda a noção de encarnação do mal que ela propõe inicialmente, levando o espectador a um filme com enredo infantil, apesar de a proposta ser completamente diferente. É engraçado afirmar isso, mas o desenho animado traz uma antagonista de forma muito mais contundente e assustadora do que o próprio longa Malévola, que propôs uma releitura sob a perspectiva do mal. Uma triste decepção.