Crítica: Joy – O Nome do Sucesso

hoy2-1024x475
Família disfuncional: Como é tradicional dos filmes de David O.Russell núcleo familiar de Joy é um dos enfoques do realizador

 

Quando começou sua carreira nos anos de 1990 com filmes como Procurando Encrenca ou Três Reis, David O. Russell não dava sinais do tipo de diretor que se tornaria com títulos como O Vencedor, O Lado bom da Vida e Trapaça, longas que lhe renderam três indicações quase que consecutivas ao Oscar de melhor filme e melhor diretor. Naquela época, O. Russell tratava-se “apenas” de uma promessa do circuito indie que começava a cair nas graças da crítica e chamar a atenção da mídia especializada pelo seu temperamento forte e por suas constantes discussões com seus atores nos sets dos seus longas, como aquela que protagonizou com George Clooney em Três Reis e a mais famosa com Lily Tomlin em Huckabees – A Vida é uma Comédia. Desde que começou a seguir um certo tipo de fórmula que tem agradado os votantes do Oscar, os filmes do O. Russell parecem não ser mais os mesmos, mas também adquiriram uma estranha constância nas suas estruturas e apresentações de narrativas e personagens. O mais novo título dessa safra do realizador, Joy – O Nome do Sucesso, contudo, parece não ter agradado tanto a Academia quanto os filmes anteriores do diretor, tanto que dele apenas a sua protagonista mereceu uma indicação ao prêmio. A exclusão é merecida, mas não podemos deixar de mencionar que Joy – O Nome do Sucesso apresenta na sua estrutura e abordagem narrativa riscos muito maiores que os títulos anteriores do diretor.

joy-02
Parceiros habituais: Em seu novo longa, O.Russell volta a trabalhar com antigos colaboradores como Jennifer Lawrence, Bradley Cooper e Robert DeNiro

 

No longa, Jennifer Lawrence, que ganhou o Oscar de melhor atriz com O Lado bom da Vida, dirigido por O. Russell, e também esteve em Trapaça, interpreta Joy, uma jovem mãe de dois filhos divorciada que assume a responsabilidade de dar suporte para a sua grande e complicada família, mas que encontra-se em uma fase da vida na qual faz um balanço a respeito daquilo que ela esperava ser quando se tornasse adulta e a mulher que ela é de fato. Em meio a essa crise pessoal, Joy inventa um utensílio de limpeza doméstica que pode tirar ela e a sua família de alguns problemas financeiros, tornando-se o nome central de um negócio que viria a ser extremamente lucrativo no futuro.

David O. Russell adorar trazer como centro das suas histórias famílias disfuncionais formadas por diversos personagens, por vezes, reunidos em um mesmo ambiente. O olhar de O.Russell para esses núcleos familiares é sempre muito forte em seus filmes, foi assim em O Vencedor, em O Lado bom da Vida e isso se repete em Joy – O Nome do Sucesso. Porém, se em dada medida, isso era bem administrado pelo diretor nos outros dois filmes, aqui tudo fica um pouco disperso. Parece muito claro que o filme é de Jennifer Lawrence e do grande feito da sua personagem e são nos momentos em que o realizador centra sua narrativa em Joy que o longa tem os seus melhores momentos. Ao tentar suprir a demanda da apresentação dos familiares da protagonista e suas dinâmicas com ela, tudo fica um tanto quanto disperso, e a centralidade de Joy nesse núcleo disfuncional parece ser “engolida” por uma série de personagens que, se parecem interessantes ao próprio filme conferindo um certo humor à história, tem um tempo de cena escasso o suficiente para fazer com que o espectador compreenda muito pouco sobre eles. O caso mais emblemático é o da personagem de Diane Ladd, intérprete da avó de Joy, uma personagem cuja importância é sempre sublinhada pelo longa, mas cujo laço com a protagonista, factualmente, é pouco trabalhado na obra. Quanto aos demais, interpretados por atores do calibre de Robert DeNiro, Virginia Madsen e Édgar Ramirez, tem todos os seus momentos, mas na ânsia de suprir todos eles o diretor acaba não conseguindo desenvolver substancialmente nenhum. Uma pena, pois é através deles e dos seus respectivos laços com Joy que dimensionamos de fato o lugar e a importância dessa personagem nesse núcleo familiar, algo que é dito com frequência ao longo do filme, mas cuja extensão jamais é sentida pelo público.

jennifer-lawrence-channels-joy-mangano-in-joy-teaser-trailer
Estrela: Jennifer Lawrence é a grande atração do filme na pele de Joy

 

Há ainda em Joy – O Nome do Sucesso o mérito de querer transformar uma história real com mensagens motivacionais e personagens inspiradoras em uma narrativa que fuja dos recursos convencionais a esse tipo de história. Portanto, nada de trilhas grandiloquentes, narrativa linear, muitos picos dramáticos… O filme de David O. Russell procura se distanciar do lugar comum, o que é particularmente muito bom e interessante. É uma pena que o diretor esgarce sua narrativa a tal ponto que em dado momento fica difícil entender exatamente onde ele quer chegar com a história de Joy. De irretocável mesmo, só a ótima interpretação de Jennifer Lawrence, que se está longe de ter um desempenho tão formidável quanto aquele que a revelou para os holofotes de Hollywood em Inverno da Alma em 2010, pelo menos está magnética e consegue modular com destreza todos os caminhos percorridos por sua personagem ao longo do filme.

Ao querer transformar a trajetória edificante da sua protagonista em um longa que foge da abordagem comumente conferida a narrativas baseadas em fatos reais, David O.Russell acaba transformando o seu filme em uma “faca de dois gumes”: Se por um lado é louvável que o diretor proponha um modo diferente de contar um modelo de história com propósitos e caminhos largamente conhecidos pelo grande público, por outro, o resultado não parece plenamente satisfatório, afinal, na ânsia de ser muito mais do que ele é, Joy – O Nome do Sucesso acaba mostrando-se como um filme de narrativa relativamente frouxa. Um pouquinho mais ousado do que o que o realizador mostrou em filmes como Trapaça, O Lado bom da Vida e O Vencedor, Joy – O Nome do Sucesso é um filme que percorreu formatos e caminhos interessantes, mas cujo resultado – que está longe do fiasco cinematográfico, diga-se de passagem – não chega a impressionar.

Pin It on Pinterest