Crítica: Drácula – A História nunca Contada

Dracula Untold

Os vampiros não têm mais “moral” que tinham antes, nem mesmo no cinema que tanto celebrou sua mitologia. Não pela banalidade da violência urbana, o verdadeiro terror da vida real, que nos impõe cenários e personagens muito mais assustadores do que Drácula e cia., mas por tendências e modismos da própria indústria do cinema que converte qualquer material clássico aos formatos e maneirismos do momento. E se Crepúsculo traduziu a mitologia vampírica para a comunidade emo e suas variações, Drácula – A História nunca Contada parece adaptar o personagem clássico  de Bram Stoker, o “pai” de todos os “chupa-sangue”, para a geração Marvel. Explico mais adiante…

Drácula – A História nunca Contada conta o passado de Vlad Tepes (Luke Evans), o temido Conde Drácula. Tepes morava na Transilvânia e, como centenas de crianças daquela terra, foi entregue aos turcos pelo rei para pôr fim a uma briga entre os povos que perdurava por gerações e mais gerações. Com os turcos, Vlad torna-se um grande guerreiro e fica conhecido por empalar os seus inimigos. O jovem retorna ao seu antigo reino e torna-se príncipe, governando-o ao lado de sua amada Mirena (Sarah Gadon) com quem tem um filho. A paz de Tepes é interrompida quando os turcos retornam às suas terras e mais uma vez exigem que seu povo entregue cem crianças, caso contrário, enfrentarão uma violenta guerra. Tepes então cede aos seus impulsos e sela um pacto com as trevas em troca da prosperidade da sua gente e da sua família.

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O filme de Gary Shore até que segue, em suas primeiras horas, um caminho interessante, não sendo audacioso em sua estética ou narrativa, mas mantendo o ritmo da trama e sendo honesto a sua premissa de contar a vida do personagem antes de se tornar o Drácula, retratando-o crível e humano. No entanto, esta nova versão do clássico personagem de Bram Stoker ultrapassa o limite do risível ao torná-lo uma espécie de super-herói com uma força descomunal e uma capacidade de se transformar em uma revoada de morcegos ou de controlar a mesma. Shore ainda investe em sequências nas quais as câmeras passam a ser um instrumento para experimentarmos o olhar de Drácula sobre a descoberta dos seus poderes e sua utilização. Enfim, um emaranhado de escolhas fora de contexto que mais se adequariam a um novo super-herói qualquer do que ao denso personagem de Bram Stoker.

O elenco não chega a comprometer. Luke Evans faz o que pode com o Drácula que lhe é dado. Sarah Gadon, a musa de David Cronenberg que aqui vive a amada de Vlad Tepes, só está no filme para ilustrá-lo com seus belíssimos traços. Não é um filme de performances, que exige uma grande dramaticidade. Em Drácula – A História nunca Contada, seguindo a tradição dos blockbusters medianos, privilegia-se sua pirotecnia. Mais um sinal de que o “espírito” do personagem foi descartado. Bem diferente do Drácula de Francis Ford Coppola, de 1992, que firmava o seu protagonista como uma figura trágica, complexa e fascinante pelo horror e pela paixão, aqui, a trajetória do Drácula sugere a tragédia, mas essa promessa nunca é cumprida ou levada a sério como deveria pelo longa, que prefere impressionar – algo que nunca consegue – o público com muitos efeitos visuais e sequências barulhentas.

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Um dos personagens do filme , em dois momentos da trama, e que propositalmente ou não nos remete a série Jogos Mortais (prefiro acreditar que não foi proposital porque ai o filme cairia na zona do risível mesmo), sugere “Que o jogo comece!”. Parece um claro intento dos realizadores em iniciar uma franquia a partir desse longa. Uma pena que, assim como acontece com tanto material bom que cai nas mãos dos estúdios e poderiam ser levados para as telas com “culhões”, afinal, dinheiro não falta, Drácula – A História nunca Contada é mais um blockbuster entre tantos que existem por ai na praça. Não fosse o título, nem daríamos conta que se trata de uma versão do lendário personagem de Bram Stoker. Parece mais uma fotocópia do Batman.