Crítica: Como eu era antes de você

Em certos casos, soa exagero creditar o sucesso de um filme ao trabalho de um único ator. Por mais que o desempenho de um protagonista seja brilhante, ele não consegue carregar nas costas um longa-metragem sozinho. No caso de Como eu era antes de você não é nada exagerado entender que grande parte do êxito do romance pode ser creditado na conta de Emilia Clarke, que de mãe dos dragões em Game of Thrones à doce cuidadora de um milionário tetraplégico faz um trabalho fabuloso nesta adaptação do best-seller homônimo de Jojo Moyes. Claro que o filme como obra cinematográfica em si não faz feio. De uma maneira geral, a diretora Thea Sharrock o conduz sem pieguice e o roteiro da própria Jojo Moyes é comedido, evitando diversos chavões. Contudo, a presença de Clarke e a maneira como a atriz conduz sua participação ao longo de todo o filme faz toda a diferença em Como eu era antes de você.

O longa conta a história de Will, um jovem rico e bem-sucedido em sua carreira surpreendido por um acidente que o leva a tetraplegia. Com o tempo, a situação do rapaz começa a deixar seus pais preocupados, em função da sua melancolia e amargura, e eles resolvem contratar Lou Clark, uma jovem cuidadora, tudo para que o filho tenha uma melhor assistência em casa mas também uma nova e animadora companhia. Aos poucos, o jeito simples, sensível e alegre de Lou acaba conquistando Will e esse relacionamento transforma a vida de ambos.

Em sua apresentação formal como obra cinematográfica, Como eu era antes de você não traz nenhuma ruptura com todo o catálogo já existente do seu gênero. Tudo é muito previsível: da falta de afinidade e resistência inicial, Lou e, principalmente, Will vão baixando a guarda, conhecendo um ao outro e se apaixonando. A maneira como a diretora Thea Sharrock nos leva a isso também não é novidade alguma: da simplicidade da sua condução (algo muito bem-vindo, por sinal) a maneira como seus personagens se movimentam na história, suas falas, a trilha sonora, repleta de hits românticos contemporâneos interpretados por ídolos que vão de Ed Sheeran e Imagine Dragons. Tudo em Como eu era antes de você é isca para fisgar quem gosta do gênero e é suscetível a seu “canto da sereia”. Acontece que apesar de seguir uma cartilha previamente conhecida, Como eu era antes de você evita a armadilha fácil da manipulação emocional do espectador e acaba sendo muito natural na maneira como aplica os seus gatilhos afetivos.

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Não há, ao longo de todo o filme, aquela sensação escancarada de que a diretora está fazendo de um tudo para arrancar lágrimas do público, algo perceptível, por exemplo, em A Culpa é das Estrelas, só para citar uma produção recente. O espectador se emociona em Como eu era antes de você pelo envolvimento natural que tem com seus personagens, seus dramas e por sentir uma empatia profunda com suas trajetórias pessoais. É nesse ponto que chegamos ao desempenho de Emilia Clarke e como ele é fundamental na construção desse afeto natural pela obra e pelo caminho percorrido por sua personagem nela. Como Lou Clark, Emilia constrói uma heroína apaixonante, solar… O tom da composição de Clarke teria tudo para leva-la ao overacting (a interpretação exagerada) já que Lou Clark tem características capazes de fazer uma atriz cair nesta armadilha. Ao compor uma garota de origem simples, sem grandes ambições na vida e com todo o seu figurino e jeito meigo e “infantilizado”, Emilia Clarke, no entanto, não opta pela caricatura. A atriz torna Lou uma garota acessível ao público, capaz de gerar empatia, alguém de “carne-e-osso”, mas, ao mesmo tempo, singular tamanha a leveza, doçura e honestidade com que a jovem conduz a sua vida e suas relações. É encantador acompanhar Emilia Clarke em Como eu era antes de você. Sam Claflin, por sua vez, consegue trafegar pela amargura e cinismo de Will Traynor sem cair no igualmente fácil território do exagero ao evitar que seu personagem se transforme em uma figura completamente antipática na história, algo que seria desastroso para o longa, afinal, ele é o interesse amoroso de Lou e o responsável por sua transformação. O restante do elenco ainda é formado por Janet McTeer (indicada ao Oscar por Livre para Amar Albert Nobs), Charles Dance (também de Game of Thrones), Matthew Lewis (o Neville da franquia Harry Potter) e Brendan Coyle (o Sr. Bates de Downton Abbey), todos muito eficientes em papeis pontuais.

Com muita lucidez, moderação no dramalhão e, ainda assim, fortalecendo os seus vínculos com toda uma tradição de filmes do gênero ao oferecer tudo aquilo que o seu público espera dele, Thea Sharrock realiza, ao lado da roteirista Jojo Moyes, um longa capaz de emocionar as plateias sem “forçações de barra”. A maneira como Como eu era antes de você equilibra suas demandas comerciais sem deixar que tudo isso afete a sua concepção criativa e a condução dos afetos da plateia pelo filme e por seus personagens é o grande mérito da dupla, que ainda consegue extrair interpretações certeiras dos seus atores, em especial Emilia Clarke, que eterniza uma heroína romântica cujos adjetivos que possamos utilizar para definir sua presença em cena jamais serão justos o suficiente para dimensionar a sensibilidade da sua performance.

Assista ao trailer: