Crítica: Colossal

Colossal provavelmente ficará com o título de filme com a premissa e o desenvolvimento mais absurdos de 2017. Ainda que o longa do diretor espanhol Nacho Vigalondo (de Perseguição Virtual) não seja isento de deslizes, não há como negar que estamos diante de uma obra que prima pela criatividade ao contar a história de uma jovem desempregada com sintomas de depressão e alcoolismo que se vê ligada ao ataque de um monstro gigante em Seul, capital da Coreia do Sul.

Conceitualmente, Vigalondo, também roteirista do filme, faz de Colossal um longa que se apropria do cinema oriental marcado pelas histórias de monstros gigantes que invadem cidades ou disputam esse espaço com outras criaturas, mas no fundo o realizador quer falar de questões íntimas da sua protagonista, vivida por uma inspirada Anne Hathaway. Usando tais referências como metáforas para os conflitos existenciais e de relacionamento da mesma, Vigalondo realiza um filme perspicaz, engraçado e sensível, ainda que arque com as consequências inevitáveis de ir ao extremo com o absurdo da sua história.

Em Colossal Anne Hathaway vive Gloria, uma mulher que se desentende com seu namorado Tim (Dan Stevens, da série Downton Abbey) porque não consegue arrumar emprego e costuma varar a madrugada regada a álcool. Quando os dois se separam, Gloria pega suas coisas e retorna a cidadezinha em que fora criada, se reencontrando com Oscar, papel de Jason Sudeikis (de Quero Matar Meu Chefe), um amigo de infância. A personagem de Hathaway acaba conseguindo um emprego de garçonete no bar de Oscar e encontrando uma estranha conexão entre sua vida e o reiterado aparecimento de um monstro em Seul. Aos poucos o espectador percebe que o que o realizador está sinalizando com sua premissa, que posteriormente revela elementos ainda mais fantásticos, é que tudo é pretexto para construir uma narrativa de amadurecimento e evolução da própria protagonista da história lutando contra monstros internos (vícios, depressão, medos etc) e externos (relacionamentos com homens abusivos ou omissos) algo que cria paralelo com a clássica disputa entre kaijus (os monstros orientais do cinema – por vezes com robôs gigantes) pelo controle de uma metrópole. No final das contas, Colossal acaba sendo um filme que narra a tomada de rédeas da própria vida por Glória.

Como sinalizado no início, Colossal não é isento de deslizes. Seu roteiro por vezes se perde nas tentativas de construir uma certa logicidade a sucessão de seus acontecimentos fantásticos. Acontece que o longa possui méritos que superam em larga escala suas falhas. A maneira como Vigalondo estabelece o encontro entre a história de Gloria e as aparições do seu kaiju é curiosa e serve de fato para construir uma protagonista complexa, que está bem distante do protótipo da heroína romântica e que por apresentar falhas tem muito a evoluir até o desfecho do filme, ganhando gradualmente autonomia. Muitas vezes  por não se levar tão a sério e por trazer o verniz do fantástico, Colossal traz como risco a dificuldade de se vender para sua plateia, é “fora da casinha” demais para o público adolescente que lota os multiplexes, mas também pop demais para públicos que procuram um cinema mais refinado (ou que crê ser mais intelectualmente refinado que outros cinemas). Colossal pode ser satisfatório para ambos se for assistido sem resistências e com muita tolerância para os caminhos tortuosamente esquisitos de sua história.

Encontrando uma forma curiosa e singular de contar a trajetória da sua protagonista e extrair reflexões profundas sobre a psicologia e as relações sociais da mesma, mas também oferecendo ao público um outro modo de fazer o cinema kaijuColossal não será um filme que deixará o espectador em cima do muro ao final da sessão. Ame-o ou deixe-o, uma coisa é certa, Nacho Vigalondo não escolheu caminhos muito óbvios em um filme que mantém a gente curioso a respeito do lugar para onde irá nos levar depois de surpreender a gente com sua anarquia peculiar.

Assista ao trailer do filme: